Farsa de Inês Pereira

 

Gil Vicente ; Farsa de Inês Pereira

Caraterização da personagem Inês; personagem modelada que evolui ao longo da obra em três fases, momentos.

1. Solteira:

. é ociosa e preguiçosa (“finge que está lavrando”), detesta a costura e despreza a vida rústica do campo;

. o seu quotidiano é monótono e entediante: costura, borda e fia;

. vive descontente, revoltada e insatisfeita com a sua vida: aborrecida e enfadada com as tarefas domésticas; presa, fechada e confinada à casa; impossibilitada de se divertir como as jovens da sua idade e sem liberdade;

. é alegre, quer sair de casa e divertir-se, mas é contrariada pela mãe;

. é ambiciosa, sonhadora e idealista, anseia casar-se com um homem que, ainda que pobre, seja “avisado” (isto é, discreto), sensato, meigo e saiba cantar e tocar viola (características do homem de corte), para fugir à vida que tem, viver alegre e livre e ascender socialmente;

. julga que, sendo “aguçosa” (delicada), não lhe será difícil arranjar marido e casar;

. a carta que Pêro Marques envia não lhe agrada; considera-o um “vilão” disparatado e simplório;

. insensível e cruel, troça e desdenha de Pêro Marques quando este a visita e rejeita-o, por o considerar rústico, simplório, um “vilãozinho” que não corresponde ao seu modelo de marido;

. leviana e pretensiosa, por considerar que Pêro Marques é antiquado por não se aproveitar do facto de estar sozinho com ela

. segundo a sua conceção, o casamento faz-se por amor e é sinónimo de libertação (do “cativeiro” da vida de solteira e da sujeição à mãe), daí que deseje um homem sensato, meigo e com dotes musicais; os bens materiais não são necessários.

2. Casada e viúva:

. casa com Brás da Mata, o Escudeiro (homem que parece corresponder às suas exigências e constituir o meio de emancipação e de ascensão social), sem saber que ele é pobre e interesseiro;

. fica a viver em casa da mãe, que se retira para viver num casebre;

. é infeliz, pois o marido não a deixa cantar e prende-a em casa:

- reclusão em casa;

- falta de contacto com o exterior e com outras pessoas;

- absoluta submissão aos ditames do marido;

- entrega ao trabalho;

. fica sozinha, vigiada pelo Moço, quando o seu marido vai para Marrocos lutar contra os mouros, o que revela o seu estatuto social desfavorecido;

. mostra-se revoltada com a sua situação e conclui que foi imprudente na escolha do marido, arrependendo-se por não ter optado por um pretendente mais dócil;

. reconhece, num momento de autocrítica, que errou ao rejeitar Pêro Marques e ao casar-se com o Escudeiro;

. deseja a morte do marido e jura que se casará uma segunda vez com um marido que seja submisso, para gozar a vida e se vingar das provações sofridas enquanto foi casada com Brás da Mata;

. não se comove com a morte do marido, pelo contrário, sente-se alegre e livre;

. é hipócrita, fingida e dissimulada (quando é visitado por Lianor) ao chorar pelo marido morto e ao dizer que está triste, simulando dor e luto;

. reconhece que a experiência de vida ensina mais do que os mestres (o saber livresco, teórico: “Sobre quantos mestres são / experiência dá lição”): o casamento com o Escudeiro ensinou-lhe o engano dos seus ideais;

. o casamento com o Escudeiro altera o seu conceito de “libertação”:

- inicialmente: sinónimo de casamento com um homem da corte, discreto;

- após o casamento: consciência de que o matrimónio pode ser sinónimo de cativeiro e subjugação;

- após a notícia da morte do Escudeiro: opção por um “muito manso marido” como forma de emancipação / libertação.

3. Casada em segundas núpcias:

. materialista, pragmática e calculista, decide casar-se com Pêro Marques (pois este é abastado e ingénuo e tem consciência de que se lhe imporá e ultrapassará, com este casamento, as limitações da sua condição de mulher);

. casada com Pêro Marques, ganha a autonomia que sempre desejou, a ascendência sobre o marido e a liberdade que lhe permite ter um amante, num contraste claro com o encerramento em casa e a opressão de que era vítima às mãos do Escudeiro);

. canta e, livre, sai de casa com o consentimento do marido;

. tem o hábito de dar esmola ao Ermitão de Cupido;

. inicialmente, não reconhece o Ermitão como um apaixonado do seu passado, mas acaba por cometer adultério com ele;

. abusa da ingenuidade do segundo marido e pede-lhe para a acompanhar à ermida, para um encontro amoroso com o Ermitão;

. adúltera, trai o marido com o Ermitão (“Corregê vós esses véus / e ponde-vos em feição.” – Inês vem descomposta porque teve um encontro com o religioso).

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